Todo mundo já conhece a fórmula e os caminhos que as comédias românticas americanas seguem. Ainda mais se elas foram lançadas entre os anos 90 e 2000, né? Bom, pois neste post vou tentar te convencer que essa daqui é um pouquinho só diferente das outras. Se eu não conseguir: nada na minha vida, nem na sua, vai mudar!
Como Perder Um Homem Em 10 Dias/How To Lose A Guy In 10 Days (2003) conta a história de Andie Anderson, colunista da seção How-To da estereotípica revista feminina dos anos 2000 Composure, que decide escrever um artigo sobre “Como Perder Um Homem Em 10 Dias” (Sim! Que nem o nome do filme!!) e do publicitário marqueteiro Matthew McConaughey que participa de uma aposta pra poder ganhar uma conta da empresa.
**Atenção: esse post tem possíveis spoilers. Não entrego tanta coisa, com tanto detalhe, mas me perdoa se você não gosta de spoiler. Eu não ligo muito não. Vai que você é desses.**
Andie não é como as outras garotas e tem o sonho de ser uma jornalista séria, mas no seu emprego atual é obrigada a escrever sobre bobeirinhas e coisinhas de menininhas. Quando a sua amiga termina um longo relacionamento de cinco dias e a chefe da revista decide que aquele seria um bom assunto para ser tratado, Andie decide pegar o caso dela como inspiração e criar um artigo sobre o que fazer pra perder um cara rápidão (achou que eu ia dizer o nome do filme pela terceira vez seguida?). Pra isso nada melhor que uma pesquisa de campo.
Enquanto isso, Matthew McConaughey está tentando largar as campanhas esportivas e de cerveja de sempre, pra dominar a indústria de diamantes. Tentando convencer seu chefe a conseguir a conta, ele acaba desafiado pelas marqueteiras especializadas em luxo, as Julies, a fazer uma garota se apaixonar em 10 dias: se ele consegue, a conta é dele.
Como a Composure, “uma das revistas femininas que mais crescem no país”, é o principal local onde os clientes das Julies divulgam seus produtos (estamos falando do início dos anos 2000, galera, não sei se vocês lembram como era), elas tiveram uma reunião lá mais cedo e escolheram a dedo Andie para ser o alvo do desafio. Sabemos bem onde tudo isso vai dar certo?
Aqui é o primeiro de três pontos do que eu gosto nesse filme: tanto Andie, quanto Matthew McConaughey, são pessoas meio ruins e fariam de tudo pra atingir seus objetivos profissionais. Eles são gananciosos e egoístas. Nunca pararam pra pensar nos outros. Pessoas que se dariam muito bem em São Paulo.
O segundo é que tudo o que está prestes a acontecer de maneira completamente exagerada é dentro do período de 10 dias. É um bom detalhe pra não se esquecer durante o filme. Andie por não ser como as outras garotas, vai usar de todas as artimanhas namorísticas a longo prazo possíveis pra enlouquecer o publicitário a curto prazo!
Andie faz da vida de McConaughey um inferno! Ela começa a ser “grudenta” e “carente” e “louca”, vocês sabem, essas coisas que homens ODEIAM! Eew, garotas!! Ela faz ele perder os últimos minutos de um jogo de basquete pra buscar uma bebida, arranja briga no meio de Sintonia de Amor (1993), dá uma “samambaia do amor” pra ele, photoshopa a cara deles pra ver como serão os bebês dele, liga pra mãe dele, acaba com a noite do truco e ainda apelida o pinto dele de Princesa Sofia! That’s the good stuff.
Matthew pelo outro lado, engole e aceita todas as loucuras pra não perder a aposta. Você pode achar que ele está sendo proporcionalmente mais enganado e sendo mais vítima de sofrimento, mas tecnicamente é isso mesmo! Filmes dirigidos por homens. O cara é meio torturado num looping de insanidade crescente, mas não pode desistir. O que acaba atrapalhando só o artigo de Andie, já que ele não termina o relacionamento e ela não consegue perder ele dentro dos dias que dão o título do filme. McConaughey só fica meio reclamando “é, as mulheres fazem isso aí mesmo! Aí, mulheres! Ainda as amo!” é a parte dele de ser meio ruim. Aqui a chance de equilibrar o sofrimento pros dois lados da situação é meio perdida, mas eu também acho que homem tem que se fuder mesmo. Enfim.
A pedido da amiga “encalhada” disfarçada de terapeuta de casal (muito foda), o casal vai visitar a família McConaughey, uma família muito unida e também muito ouriçada. Aqui bate uma consciência mais pesada na Andie, porque ela percebe que a família é muito querida, verdadeira e genuína e talvez Matthew McConaughey também seja muito querido, verdadeiro e genuíno. Porra, ele até ensina ela a dirigir a motoca turbinada dele! Tudo acaba num amor quente e molhado no banheiro da mãe deles aos cheiros perfumados dos peidos do Tio Arnold.
Esse momento com a família é muito lindinho. Eu tenho um fraco por momentos de família em filmes, mas aqui é tudo retratado com muita naturalidade e carinho, parece que conhecemos todas as pessoas que estão ali, sabe?
Só que tudo vai pro caralho voltando pra cidade e indo para a festa dos DeLauer, os clientes dos diamantes. Quando as Julies percebem que a conta não vai ser delas, dão um jeitinho de Andie descobrir a verdade. A chefe de Andie acaba jogando na cara do Matthew que Andie escrevia um artigo sobre um bobalhão que tava aguentando todas as loucuras dela por 10 dias. Isso tudo desencadeia uma das melhores cenas de vergonha alheia regadas a champagne, Marvin Hamlisch e Carly Simon - You’re So Vain.
Bom, aí os dois brigam, cada um vai pro seu canto. Andie decide se demitir e ir atrás de um trampo em Washington. McConaughey ganha a conta dos diamantes, mas descobre que Andie estava apaixonada por ele através do artigo da revista!!
Uma perseguição de moto pelo trânsito, provando que ele realmente se daria bem em São Paulo e ele encontra ela dentro de uns dos muitos táxis da estrada. Os dois trocam um lero apaixonado numa ponte e decidem ficar juntos. Fim do filme. Amém. Coisa linda.
O terceiro ponto que eu gosto muito e acabei perdendo o momento de comentar é: Andie e Matthew McConaughey não gostam muito do que eles fazem no emprego deles. Andie quer escrever matérias sérias e profundas que tratem de política, religião, economia, chega de futilidades! Ben (sim, o personagem de Matthew McConaughey se chama Ben) quer ir aonde o dinheiro tá bombando, chega de bobeiras como esportes e breja!
Acho que isso acaba justificando muito o primeiro ponto, no fato de que os dois fariam qualquer coisa pra melhorar a situação de trabalho deles. Meio que o que nós, classe trabalhadora, acabamos vivendo diariamente nesse mundinho capitalista. A gente engole e aceita trabalhos que não nos trazem nada ou não são aquilo que realmente queremos, mas que no fim, pagam nossas contas. Isso me pega muito. Botou o cabra pra pensar.
Você achou que uma comédia romântica mergulhada em estereótipos de relacionamentos cis heterossexual da longínqua década de 2000 em curtos e extremos 10 dias corridos te faria pensar sobre essas coisas? Pois fez.
Se quer um texto melhor, vá atrás de uma mídia especializada!!